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OPINIÃO Sábado, 18 de Janeiro de 2020, 09:53 - A | A

18 de Janeiro de 2020, 09h:53 - A | A

OPINIÃO / SEBASTIÃO CARLOS

Uma ação temerária. Qual o único sentido? [2]

É grave a intervenção do interesse pessoal sob a capa do interesse coletivo

SEBASTIÃO CARLOS



Diz-se que o interesse do Governador é a de “preservar [...] a relevante representatividade” do Estado que agora estaria abalada com o inesperado desfalque na bancada. Cita-se como exemplo desses hipotéticos danos a Mato Grosso a “repactuação do nosso federalismo fiscal ou a redistribuição de royalties de petróleo ou de compensações financeiras” e o fato de que “o início da próxima sessão legislativa deve ser marcado por votações de relevantes questões de viés federativo, como a PEC do Pacto Federativo e a Reforma Tributária” e que “os prejuízos advindos de eventual sub-representação” [...] são incalculáveis e, possivelmente, irreparáveis”. [sic]. Entre tais, aduz a destinação das emendas parlamentares que, com um representante a menos, teria forte desequilíbrio na destinação desses recursos. Veja bem o argumento levantado: “as decisões políticas nesse cenário estaria sob suspeição, o que poderia comprometer a segurança jurídica dessas deliberações e revelar-se-ia assaz perniciosas para a manutenção das instituições democráticas”. Olhe só a gravidade dessa afirmação, pois, sob o viés do governo, a ausência, ainda que passageira, de um membro da bancada federal de Mato Grosso poria em risco e abalaria os fundamentos mesmos da democracia brasileira. Ora, ora. 

A meu ver, porém, o apelo do Governador não apenas vai muito além do que afirma pretender como extrapola aos verdadeiros interesses mato-grossenses.

A eleição já esta praticamente marcada para daqui a quatro meses. Nesse meio tempo, até porque existe um recesso parlamentar de permeio, nenhuma dessas votações e debates que “assombram” o governo ocorrerá com a dita intensidade. Como qualquer pessoa medianamente informada sabe, o processo legislativo demanda tempo, às vezes excessivos. Qualquer projeto, particularmente os da envergadura dos apontados, irá por primeiro para as Comissões técnicas respectivas e demorarão a chegar a plenário. Assim, o senador a ser eleito terá tempo mais que suficiente para se integrar à rotina congressual. De outra parte, afirmar-se que não se pode aguardar a realização da nova eleição sob pena de “graves prejuízos” ao Estado é levantar, por vias transversas, sérias dúvidas sobre os dois outros membros da bancada quanto à capacidade de articulação e competências politicas e intelectivas para “defenderem” o Estado de um hipotético confronto de interesses com a União ou com outras unidades federativas. Não me parece correto tal entendimento. 

Carece de igual fundamento dizer-se, como se o fez, que “a diretriz jurisprudencial do Tribunal Superior Eleitoral, no caso de vacância decorrente de causas eleitorais no pleito ao Senado, é justamente convocar o segundo ou o terceiro colocado na eleição, utilizando-se como parâmetro o próprio art. 56, §§ 1º e 2º, da Constituição da República”. Ora, tal afirmação é absolutamente despropositada. O caput do referido artigo nada tem a ver com o caso em debate; idem para o seu parágrafo primeiro. Já o parágrafo 2º do citado artigo diz: “Ocorrendo vaga e não havendo suplente, far-se-á eleição para preenchê-la se faltarem mais de quinze meses para o término do mandato”. Ora, leitor, é exatamente isso o que está ocorrendo agora. 

Então para que serve essa Ação? Ademais, em recente decisão – agosto de 2018 – o STF, julgando a Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 5.619/DF, que tratou de caso bastante assemelhado, entendeu, sob a relatoria do Min. Roberto Barroso, da constitucionalidade de uma nova eleição. Então, leitor, qual a razão para se mobilizar servidores categorizados do Estado tanto como a estrutura do Poder Judiciário para uma inócua finalidade, ainda por cima nati-morta? 

Cabe ainda a indagação: do ponto de vista da representação judicial, caberia ao governador propor tal Ação? Tenho dúvidas. Se considerarmos que não existe risco à unidade da Federação ou qualquer ameaça à Constituição Federal, tal como previsto no art. 3º da Constituição do Estado, modestamente, entendo que o governador não tem legitimidade para interpor a Ação. Ao extremo, tal medida caberia, em tese, ao Conselho de Governo, tal como previsto no art. 73 da CE, do qual fazem parte, além do governador e do vice-governador, o Presidente da Assembleia Legislativa, os líderes das bancadas partidárias na Assembleia Legislativa, além de outros previstos na lei que regulamenta a organização e funcionamento desse Conselho, cuja função, tal como está no parágrafo único desse dispositivo, é a de pronunciar-se sobre questões relevantes suscitadas pelo Governador do Estado, considerada aí a estabilidade das instituições e os problemas emergentes, de grave complexidade e implicações sociais, que venham a surgir. Admitindo-se, por generosidade argumentativa, que existisse algum risco às instituições ou problemas de grave complexidade social, aí sim, o Conselho de Estado, mas não o governador de per si, poderia eventualmente propor a Ação para dar posse ao terceiro colocado no pleito senatorial. 

E agora surge uma nova questão. A Ação do Estado perante a STF é coincidente com a Ação já proposta pelo Partido do terceiro colocado.  Os argumentos, em uma e outra Ação, se equivalem. Para o PSD o “hiato” entre a perda do mandado e o novo pleito é “flagrantemente inconstitucional”, pois a bancada do Estado ficará em condição de desigualdade perante as demais unidades federativas.

No entanto, é preciso enfatizar que a Constituição da República é clara ao determinar, no parágrafo 2º do art. 56, que ocorrendo à vacância do titular, não havendo suplente e se faltarem mais de 15 meses para o término do mandato, será convocada eleição. Caso que aqui cabe como uma luva. Por isso mesmo é que houve, no julgamento do TRE e no do TSE, apenas um voto favorável à tese do terceiro colocado e a do governador. Portanto, está amplamente rejeitado o argumento que o governador agora quer ressuscitar. Além do mais, o que ambas as Ações de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental buscam é temerariamente modificarem um dispositivo de ordem constitucional. 

Mas, se o partido politico e o seu filiado se acham em pleno direito da postulação, o mesmo, entendo, não ocorre com a atuação do governador. Em vários pontos as duas Ações, embora convergindo para um mesmo objetivo, têm situações absolutamente distintas. Enquanto que o PSD e seu filiado defendem interesse autêntico, embora equivocado, a iniciativa do governador foge aos interesses legítimos do Estado. 

Não é mera coincidência que esta Ação vem de ser proposta para obter um resultado que visa a beneficiar diretamente a um companheiro seu, que participou da mesma coligação – Prá mudar Mato Grosso – que o elegeu e, não bastasse, é hoje membro de seu governo como chefe do Escritório de Representação em Brasília.

Configura-se, pois, aqui uma questão de gravidade intransponível: a intervenção do interesse politico e partidário, e até pessoal, sob a capa da defesa do interesse coletivo, enquanto que o Governador deve [precisa] ser o governante de todos os mato-grossenses. 

Sebastião Carlos Gomes de Carvalho é advogado e professor.

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