ALLAN PEREIRA E MIKHAIL FAVALESSA
Da Redação
Reprodução/Midiajur
Estudo da Metamat indicou em 2022 os pontos de risco de deslizamento de terra e queda de blocos na área do Portão do Inferno
O alto grau de risco de deslizamentos e quedas de blocos de rocha na região do Portão do Inferno, na MT-251, já eram de conhecimento da Secretaria de Estado de Infraestrutura (Sinfra), do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e de outros órgãos há, pelo menos, 16 anos. É o que comprovam estudos e comunicações trocados entre os órgãos públicos aos quais o Midiajur obteve acesso por meio da Lei de Acesso a Informação (LAI).
A fragilidade da área ficou evidenciada em trocas de comunicações entre os órgãos em processos que tratavam do projeto do Governo do Estado para a criação de um complexo turístico na região, que contaria, inclusive, com uma passarela de vidro sobre o precipício. Geólogos da Companhia Matogrossense de Mineração (Metamat) elaboraram um estudo, em colaboração com o ICMBio e a Defesa Civil, no qual registraram os pontos mais críticos para deslizamentos e quedas de rocha sobre a área turística, e classificaram a área como de alto risco.
Conforme os documentos, o risco de queda era conhecido desde 2008, quando um grande bloco de rochas se desprendeu da cachoeira Véu de Noiva e matou um banhista, que estava na parte inferior da queda d‘água. A fatalidade levou ao fechamento do Parque Nacional de Chapada dos Guimarães por um ano. Uma análise geológica da época apontou para grandes processos de erosão que podem ocasionar quedas de blocos de rocha.
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O Portão do Inferno é um mirante na MT-251, que beira um precipício de mais de 50 metros de profundidade no sentido oeste (Cuiabá-Chapada). A leste, no sentido (Chapada-Cuiabá), fica uma escarpa (paredão) formada de arenito, cujo pico chega a 50 metros de altura. O local é um conhecido ponto turístico da região de Chapada dos Guimarães.
Por conta da seca e das fortes chuvas que caíram na região desde o ano passado, se iniciou um processo rápido de erosão de sedimentos e rochas dos paredões da escarpa e também do precipício. Foram três deslizamentos desde o começo de dezembro passado. Desde então, há registro diário da queda de pequenos sedimentos, além de rachaduras no viaduto sobre o precipício.
Projeto de mirante e alertas
Em 2019, a Secretaria Adjunta de Turismo do Estado apresentou o projeto para a criação do terminal turístico do Portão do Inferno, para revitalização da área. Um analista ambiental do ICMBio respondeu, em janeiro de 2020, que o mirante é um local de “fragilidade geológica” e destacou a questão dos deslocamentos de blocos rochosos. Ele também citou outros laudos produzidos em diferentes contextos nos dez anos anteriores que reforçavam o perigo.
Reprodução/Midiajur
Partes do topo da "escarpa" do paredão apresentavam possibilidade de queda
Entre os estudos, está um laudo produzido para uma ação judicial de reintegração de posse, que foi movida pela Promotoria de Justiça de Chapada dos Guimarães contra um fazendeiro, no ano de 2010. O estudo apontou que “o material que forma a rocha [do Paredão do Inferno] desagrega-se facilmente, podendo transformar-se em areia apenas com a leve pressão dos dedos”.
“Além disto, segundo o mesmo laudo, fraturas naturais nas rochas dispostas horizontal e verticalmente facilitam ação da erosão causada pela água das chuvas e potencializam a queda de blocos rochosos”, apontou o ICMBio na ocasião.
Os resultados desse laudo, de acordo com o analista do ICMBio, foram corroborados por um estudo realizado por professores e pesquisadores da área da Geologia da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) no ano de 2015.
Um dos estudos mais recentes é do próprio Governo de Mato Grosso. A Secretaria Adjunta do Turismo pediu à Metamat novos estudos geológicos do Portão do Inferno, em 2022, em meio à discussão com o ICMBio sobre a possibilidade de instalação do complexo turístico.
Na época, a pasta citou que pediu o estudo por conta do desabamento de uma rocha no lago de Furnas, em Capitólio (MG), no início do mesmo ano. O incidente na cidade mineira matou dez pessoas, que estavam em barcos para a visitação dos cânions. A Polícia Civil de Minas Gerais concluiu que a queda ocorreu por processo natural.
Também pesou, segundo o documento, a enxurrada nas serras de Petrópolis, além de inundações ocorridas no sul da Bahia, causadas pelas fortes chuvas e que deixaram de centenas de mortos e desabrigados. Esses incidentes também ocorreram no início de 2022. A preocupação da pasta de Turismo era se eventos assim poderiam ocorrer no Portão do Inferno.
A conclusão dos geólogos de Metamat foi clara em identificar o Portão do Inferno como uma região de alto grau de risco para deslizamento de rochas, quedas de grandes placas da escarpa e enxurradas, que podem levar tudo o que encontra no caminho paredão abaixo, atingir a rodovia e chegar ao precipício.
Reprodução/Midiajur
Trincas no asfalto foram identificados pela Metamat como indícios de instabilidade na ponte
O estudo do órgão encontrou “visíveis descontinuidades estruturais” no paredão leste da rodovia, que “propiciam isolamento de blocos unitários de rocha”. A fragmentação dessas rochas, segundo os geólogos, pode ser agravada pelo trânsito na MT-251. Esses blocos podem cair e se soltar, mesmo sem a presença da chuva, e atingir a rodovia.
“Este quadro natural, ainda pode ser acelerado por ações antrópicas [humanas], como, por exemplo, ondas e vibrações provenientes de grande trafego de veículos pesados (caminhões), que ainda utilizam esta rodovia”, destacou a Metamat.
Os geólogos do governo identificaram também fraturas verticais nas escarpas, causadas por erosão e chuva, que podem se desprender e cair em direção ao precipício.
Outro ponto levantado pelo estudo é que a rede de drenagem do viaduto do Portão do Inferno, construído na encosta do precipício, foi mal planejada e executada. Isso por que o escoamento da água da chuva, que leva lama, sedimentos e rochas, coloca em risco as estruturas de sustentação do viaduto. “Não temos conhecimento de vistorias técnicas para avaliar a estabilidade dessa obra de engenharia, ainda mais por ela se encontrar em local de dificil acesso”, destacam os profissionais.
Agravados pela ação humana, os geólogos identificaram sinais de enxurradas e deslizamentos de rochas, que podem comprometer a estrutura do viaduto. O estudo registrou ainda que as rupturas ou trincas no asfalto da MT-251, que foram percebidos em uma visita do Tribunal de Contas neste ano, indicam possibilidade de "rompimento de talude.”
No final, a Metamat, em 2022, classificou a área do Portão do Inferno como "R4", "o que significa uma condição de muito alto risco", segundo os geólogos do órgão estadual.
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