MIKHAIL FAVALESSA
Da Redação
Um estudo publicado na última terça-feira (16) encontrou 10 tipos de agrotóxicos nas águas que abastecem comunidades em três cidades do Pantanal mato-grossense. Alguns dos princípios ativos encontrados foram banidos em países da União Europeia, mas são autorizados no Brasil.
No começo de agosto, foi sancionada a lei nº 11861/2022, proposta pelo deputado Carlos Avalone (PSDB) e aprovada na Assembleia Legislativa. O texto permite a utilização de agrotóxicos no Pantanal sem qualquer tipo de limitação.
A pesquisa foi feita pela Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase) em parceria com o Núcleo de Estudos Ambientais e Saúde do Trabalhador (Neast) do Instituto de Saúde Coletiva (ISC) da UFMT.
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Em maio de 2021 foram feitas coletas de águas da chuva, córregos, rios, cachoeiras, poços artesianos, caixas d'água de escolas rurais e tanques de psicultura em quatro comunidades em Poconé, Cáceres e Mirassol D'Oeste.
O estudo é assinado pelas pesquisadoras Franciléia Paula de Castro, Lucinéia Miranda Freitas, Marcia Leopoldina Montanari Corrêa e Naiara Andreoli Bittencourt. Elas traçam um cenário de impactos que vêm sendo causados ao Pantanal pelo agronegócio, pela mineração e pelo avanço de hidrelétricas dentro do bioma e também em suas nascentes no Cerrado.
O documento menciona "o avanço da fronteira agrícola de soja e outros monocultivos, o aumento de denúncias envolvendo deriva de pulverização aérea e terrestre de agrotóxicos, como ocorrido na comunidade quilombola Jejum em Poconé em março de 2021, com intoxicação aguda de 15 pessoas pela poeira tóxica resultante da colheita
de soja na fazenda vizinha a comunidade".
"Observou-se o não cumprimento generalizado no estado do Decreto Estadual do Mato Grosso 1.651/2013, que regulamentou a Lei Estadual 8.588/2006, e que estipula distância mínima de 90 (noventa) metros para aplicação de agrotóxicos de casas, fontes de águas e estradas", apontam.
Reprodução
Água que abastece comunidades no Pantanal está contaminada com agrotóxicos em Mato Grosso
As amostras foram analisadas pelo Laboratório de Análises de Resíduos de Pesticidas (LARP) da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). O estudo detectou um perfil em que 60% dos produtos encontrados eram herbicidas, 20% eram inseticidas e 20% eram fungicidas.
Foram encontrados 10 tipos de agrotóxicos com "alta frequência", ou seja, em mais de um tipo de amostra. Os herbicidas Atrazina, Picloram, 2,4-D, Clomazone, Tiobencarbe, Clorimurom etílico e os inseticidas - Imidacloprido e Fipronil; os fungicidas Tebuconazol e Carbendazim se enquadraram nessa classificação.
Os agrotóxicos detectados em maior frequência nas amostras analisadas foram Clomazone, Imidacloprido e Atrazina. Os produtos 2,4 D, Picloram e Atrazina foram os encontrados em maior concentração.
O estudo pontua que, dentre esses princípios ativos, cinco estão banidos em países da União Europeia, na Suíça, na Austrália e no Canadá por riscos ao meio ambiente e à saúde humana. São eles: Atrazina, 2,4 D, Fipronil, Carbendazim e Imidacloprido.
Dos 10 agrotóxicos identificados, oito não estão listados na resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) que contém orientações sobre águas subterrâneasm e quatro não se encontram listados na portaria de padrão de potabilidade para agrotóxicos e metabólitos que representam risco à saúde, do Ministério da Saúde.
Os dados contidos neste relatório demonstram a alta persistência dos agrotóxicos em ambientes aquáticos, a contaminação de lençóis freáticos, águas superficiais e subterrâneas. Colocando em risco a vida humana, de uma diversidade de organismos aquáticos e microrganismos do solo
"A partir dos dados apresentados salientamos que a detecção de agrotóxicos em água, em qualquer concentração, estejam eles listados nas portarias ou não, indica risco para a população exposta e para o ambiente. Os parâmetros estabelecidos pelo Ministério da Saúde e Conama servem para indicar a conformidade ou a não conformidade das amostras. Segundo parecer técnico do GT de Agrotóxicos da Fiocruz, em qualquer caso em que haja detecção de agrotóxicos as amostras deverão ser consideradas não conformes, devendo ser recomendadas aos órgãos competentes um conjunto de ações de vigilância à saúde humana e ao meio ambiente", argumentam as pesquisadoras.
No estudo, as cientistas lembram que existe possibilidade de interação entre os agentes químicos encontrados, "provocando efeitos aditivos, sinérgicos, a manifestação de efeitos tóxicos de forma não linear, ou seja, não proporcional às doses, e a vulnerabilidade diferenciada dos expostos, recomenda-se a adoção de medidas mais protetivas para o ambiente e para a saúde das famílias destas comunidades expostas a agrotóxicos".
"Os dados contidos neste relatório demonstram a alta persistência dos agrotóxicos em ambientes aquáticos, a contaminação de lençóis freáticos, águas superficiais e subterrâneas. Colocando em risco a vida humana, de uma diversidade de organismos aquáticos e microrganismos do solo", avaliam.
As pesquisadoras defendem que o Pantanal é um bioma de importância global, com características únicas, e que é necessário monitoramento permanente sobre o uso de agrotóxicos, com restrição do uso deles e das atividades agrícolas com potencial de poluição e impactos.
"É urgente a criação de zonas/áreas livres de agrotóxicos e outros poluentes no entorno de comunidades quilombolas, territórios indígenas e de comunidades tradicionais. Territórios estes que desenvolvem práticas de produção de alimentos agroecológicos/orgânicos, garantindo desta forma a saúde e reprodução de atividades agroecológicas livres de agrotóxicos", registram.
Leia aqui a pesquisa completa.
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