LUCAS RODRIGUES
DA REDAÇÃO
A delação premiada do ex-secretário de Estado de Indústria, Comércio, Minas, Energia e Casa Civil, Pedro Nadaf, já foi remetida ao Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ-MT) e pode mudar o cenário da denúncia derivada da Operação Cartas Marcadas.
A informação está contida em decisão dada na última terça-feira (3) pelo desembargador Pedro Sakamoto, relator da denúncia que aponta suposto esquema de emissão fraudulenta de cartas de crédito ocorrido em 2009, que teria dado prejuízo de R$ 419 milhões aos cofres públicos.
Nadaf firmou acordo de colaboração com a Procuradoria-Geral da República (PGR), homologado em março pelo ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Em um dos depoimentos, o ex-secretário falou sobre o esquema e mencionou como envolvidos o deputado estadual Gilmar Fabris (PSD) e o procurador do Estado, Jenz Prochnow Júnior, que já são alvos da denúncia.
O julgamento para definir se a denúncia seria ou não recebida foi iniciado no dia 24 de agosto, ocasião em que Sakamoto e mais quatro magistrados votaram por rejeitar a acusação.
Todavia, o desembargador Orlando Perri – que havia solicitado vistas do processo – pediu para suspender o julgamento até que a delação do ex-governador Silval Barbosa (PMDB) fosse remetida ao TJ-MT.
Faz-se necessário o encaminhamento dos autos à douta Procuradoria-Geral de Justiça, a fim de que sejam especificados e delimitados os elementos de convicção que pretende ver juntados aos autos
Já o promotor Antônio Sérgio Piedade, que coordena o Núcleo de Ações de Competência Originária Criminal (Naco Criminal), afirmou que o ministro já enviou o conteúdo da delação de Nadaf ao TJ-MT, documentação que foi distribuída em sigilo ao desembargador Márcio Vidal.
“Informou, outrossim, que determinado “apenso” dessa delação diz respeito aos fatos apurados na 'Operação Cartas Marcadas', razão pela qual a Promotora de Justiça Ana Cristina Bardusco, subscritora da denúncia apresentada nestes autos, teria solicitado ao Des. Márcio Vidal o compartilhamento de provas, o que, contudo, segundo o douto representante ministerial, foi indeferido”.
O Pleno do TJ-MT então decidiu que, tendo em vista a informação trazida pelo promotor, seria adequado suspender o julgamento para que Sakamoto solicitasse ao desembargador Márcio Vidal que compartilhasse as provas enviadas pelo ministro Luiz Fux.
A documentação, conforme Sakamoto, deverá ser encaminhada ao Ministério Público Estadual (MPE), que fará a avaliação de quais provas serão usadas em um possível aditamento ou complementação da denúncia.
“De qualquer sorte, faz-se necessário o encaminhamento dos autos à douta Procuradoria-Geral de Justiça a fim de que sejam especificados e delimitados os elementos de convicção que pretende ver juntados aos autos, com a indicação precisa dos autos aos quais se referem, para, só então, proceder-se com a determinação colegiada, de modo a evitar ulteriores alegações de nulidade”, disse o desembargador.
Na prática, o julgamento sobre o recebimento ou não da denúncia poderá ser modificado caso as provas trazidas por Nadaf em sua delação possuam robustez. Inclusive, os desembargadores que já votaram pela rejeição da denúncia poderão rever seus votos.
A denúncia
No TJ-MT, por possuírem foro especial por prerrogativa de função, são investigados o deputado estadual Gilmar Fabris e os procuradores do Estado Dilmar Portilho Meira, Gérson Valério Pouso, Nelson Pereira dos Santos e Jenz Prochnow Júnior. Fabris nega qualquer irregularidade (leia abaixo).
Os cinco foram denunciados pelo Ministério Público Estadual (MPE) pelos crimes de quadrilha, falsificação de papéis públicos, desvio e lavagem de dinheiro.
Já na 1ª Instância, são investigados: Éder Moraes, Ocimar Carneiro de Campos, Enelson Alessandro Nonato, Dorgival Veras de Carvalho, Edmilson José dos Santos, Anglisey Battini Volcov, Laura Tereza da Costa Dias, Vanúzia da Silva Araújo e Luciano Dias de Souza.
Na denúncia, o MPE pede a devolução de R$ 418 milhões, valor que teria sido desviado dos cofres do Estado por alegada emissão de cartas de crédito supostamente indevidas e supervalorizadas.
Pelos mesmos fatos, eles já respondem a outra ação, na esfera cível, e seus bens foram bloqueados.
Alair Ribeiro/MidiaNews
O desembargador Pedro Sakamoto, relator da denúncia
De acordo com o MPE, o grupo teria se aproveitado de um processo judicial trabalhista de mais de 300 agentes de administração fazendária (AAF) para praticar a suposta fraude.
Gilmar Fabris e o ex-secretário Eder Moraes são acusados de se utilizar de influência política para convencer o então chefe Executivo estadual, Blairo Maggi (PR), a considerar como vantajosa a realização de negociação extrajudicial com os representantes do Sindicato dos Agentes de Administração Fazendária (SAAFF), que culminou na emissão de cartas de crédito indevidas e supervalorizadas.
Na época, estava prevista a emissão de duas certidões de crédito aos servidores, mas foram emitidas sete, sendo que apenas três eram de conhecimento dos servidores.
As outras quatro cartas acabaram sendo retiradas junto à Secretaria de Estado da Administração (SAD) por representantes legais constituídos pela categoria, sem o conhecimento dos agentes.
Segundo o MPE, além do desvio de receita pública, a conduta praticada pelo grupo provocou prejuízos aos servidores da categoria dos Agentes de Administração Fazendária, que foram “criminosamente ludibriados”.
Já os procuradores teriam emitido pareceres favoráveis às cartas de crédito mesmo, em tese, sabendo das irregularidades.
Perícia
Em entrevista à imprensa, após o oferecimento da denúncia, o deputado já havia apresentado uma perícia feita em outro processo envolvendo as cartas de crédito.
A perícia, feita a pedido do Tribunal de Justiça, indicou que o Estado teria gasto R$ 1,3 bilhão - e não os R$ 480 milhões efetivamente pagos, por meio de cartas de crédito -, se não houvesse sido feito um acordo para pagamento de direitos trabalhistas a 300 servidores.
“A perícia judicial feita a pedido do Tribunal de Justiça mostra que houve economia de mais de R$ 800 milhões aos cofres de Mato Grosso", disse Fabris.
"O Ministério Público errou. E errou porque foi induzido a erro por uma trapalhada da Auditoria Geral do Estado, à epoca comandada por José Alves Pereira Filho. Ele cometeu um erro grosseiro nos cálculos referentes a essa questão e disse que havia sido feito um rombo no Estado. Na verdade, a perícia judicial mostra que houve economia de mais de R$ 800 milhões aos cofres de Mato Grosso", disse Fabris.
Segundo ele, o parecer de José Alves Pereira Filho apontou que o valor a ser recebido pelos servidores era de cerca de R$ 229,8 milhões.
"Ele fez uma conta estúpida. De que os servidores tinham apenas R$ 300 milhões para receber, quando na verdade era R$ 1,2 bilhão. Ele calculou apenas os precatórios, não calculou os valores da ação transitada em julgado, em ultima instância, ou seja, no STF. Fez uma interpretação, e não uma análise exata, em cima de números”, afirmou.
O deputado também declarou que não houve fraude na emissão das 526 cartas de crédito.
Fabris disse ainda que foi acusado pelo MPE por ser casado com Anglisey Volcov, sócia do advogado Ocimar Carneiro de Campos, que defendeu os agentes fazendários por mais de dez anos e recebeu 20% dos valores das cartas de crédito, após o acordo, como honorários.
"Está tudo registrado em cartório, com certidão pública. Os honorários são legais, foram feitos contratos com todos os servidores, tudo registrado em cartório. Ora, se houvesse esquema, isso seria registrado em cartório?", indagou.
Ele também negou que tenha feito tráfico de influência durante o processo.
"Foi tudo público. O governador Blairo Maggi assinou o acordo e mandou uma mensagem para a Assembleia Legislativa. Essa mensagem dizia que o acordo era economicamente viável", disse.
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