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OPINIÃO Quarta-feira, 05 de Março de 2025, 13:36 - A | A

05 de Março de 2025, 13h:36 - A | A

OPINIÃO / CARLA REITA

Trabalho e maternidade: o direito à flexibilização da jornada para quem cuida

Carla Reita Faria Leal e Lécia Taques



 

O mercado de trabalho impõe inúmeros desafios à população feminina, e a maternidade certamente é um deles. Conciliar filhos e carreira não é uma tarefa simples, e essa dificuldade se agrava quando a trabalhadora é responsável por filhos com deficiência que demandam cuidados especiais constantes.

De fato, equilibrar a carga horária profissional com o acompanhamento dos filhos em atendimentos médicos e terapêuticos essenciais ao seu desenvolvimento, além dos cuidados diários no ambiente doméstico, exige um verdadeiro malabarismo. A rigidez da jornada laboral torna essa equação complexa e faz com que a soma entre trabalho e maternidade seja uma conta que não fecha. Por essa razão, a flexibilização da jornada de trabalho para essas mulheres é uma questão de grande relevância sob as perspectivas social, jurídica e econômica.

Nos últimos anos, observa-se uma tendência do Judiciário brasileiro em reconhecer a necessidade de flexibilização da jornada de trabalho para mães (e pais) com filhos com deficiência. Em 2022, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por unanimidade, pelo direito à redução da jornada de trabalho para servidores públicos que tenham filho ou dependente com deficiência. A decisão, inclusive, teve repercussão geral reconhecida pelo Plenário Virtual, sendo objeto do Tema 1097 (RE 1.237.867).

Mais recentemente, em novembro de 2024, a Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) confirmou a decisão de primeiro grau que determinou a redução de 50% da jornada de uma enfermeira da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), empresa pública, mãe de uma filha com Síndrome de Down. A decisão garantiu a manutenção integral do salário e afastou a necessidade de compensação de horas enquanto a criança necessitasse de terapias essenciais ao seu desenvolvimento. No julgamento, o relator, ministro Mauricio Godinho Delgado, destacou que a questão não se limita aos aspectos legais e contratuais da relação de emprego, ressaltando que "a proteção do trabalhador é uma etapa imprescindível à tutela da pessoa com deficiência que dele depende diretamente" (AIRR - 642-63.2023.5.20.0008).

Na iniciativa privada, não há legislação específica que assegure a redução da jornada sem prejuízo salarial ou necessidade de compensação para trabalhadores que desempenham papel indispensável no cuidado de pessoas com deficiência. No entanto, a Justiça do Trabalho tem consolidado esse entendimento por meio da análise casuística. Um exemplo é a decisão proferida pela Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região (TRT-7), que reconheceu o direito de uma mãe, com jornada de trabalho de oito horas diárias e 44 horas semanais, a um horário especial para cuidar do filho com Transtorno do Espectro Autista (TEA), mesmo sem previsão na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) autorizando a redução.
A decisão baseou-se no dever da sociedade de promover, proteger e assegurar o exercício pleno de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais das pessoas com deficiência (RORSum 0000022-51.2023.5.07.0028).

Tímidos avanços legislativos foram observados com o Programa Emprega + Mulheres, instituído pela Lei n.º 14.457/2022, que estabelece medidas para a flexibilização da jornada de trabalho, incluindo teletrabalho, regime de tempo parcial, banco de horas e horários flexíveis, a fim de beneficiar trabalhadoras(es) com filhos com deficiência, independentemente da idade. No entanto, a efetividade dessas medidas ainda depende da implementação prática por parte das empresas e da conscientização dos trabalhadores sobre seus direitos.

Importante ressaltar que a flexibilização da jornada de trabalho permite que mães trabalhadoras prestem os cuidados necessários aos filhos sem comprometerem a renda familiar. Além disso, contribui para a equidade de gênero no ambiente profissional, ao minimizar o impacto da sobrecarga sobre as mulheres, que ainda são as principais responsáveis pelo cuidado. Muitas delas, inclusive, enfrentam o dilema entre a continuidade da carreira e a dedicação aos filhos, como demonstram os pesquisadores Cecilia Machado e Valdemar Rodrigues de Pinho Neto, em análise divulgada pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). O estudo aponta que quase 48% das mulheres deixam ou são desligadas do mercado de trabalho até dois anos após o nascimento dos filhos.

As recentes decisões do Judiciário reforçam a necessidade de medidas concretas que assegurem o direito à flexibilização da jornada, tanto na iniciativa pública quanto na privada, para que as mulheres possam conciliam a carreira com os cuidados essenciais aos filhos com deficiência. Trata-se de um passo essencial para a promoção da igualdade de gênero e o reconhecimento do cuidado como uma responsabilidade social compartilhada.

*Carla Reita Faria Leal e Lécia Nidia Ferreira Taques são membros do grupo de pesquisa sobre meio ambiente do trabalho da UFMT, o GPMAT.

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