Carla Reita Faria Leal e Vitor Alexandre de Moraes
A responsabilidade civil objetiva no Direito do Trabalho é um assunto muito importante para empregados e empregadores, principalmente após a aprovação da Tese de Repercussão Geral pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2020, consolidada no Tema 932 e por jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que preveem a possibilidade de responsabilização objetiva do empregador por danos causados aos empregados decorrentes de acidentes de trabalho.
A responsabilidade civil pode ser classificada no Brasil em responsabilidade subjetiva e responsabilidade objetiva. Na responsabilidade subjetiva há necessidade da presença, dentre outros, dos elementos culpa ou dolo do agente responsável pelo dano; na responsabilidade objetiva, contudo, não há a necessidade da presença destes. No Brasil, quando se trata de acidente do trabalho, a regra é responsabilidade civil subjetiva, conforme art. 7°, XXVIII, da Constituição Federal, que indica nesse sentido.
Todavia, ao firmar a tese acerca do Tema 932, o STF decidiu que, em face da necessidade de alcançar justiça plena, há a possibilidade da aplicação de responsabilidade objetiva ao empregador nos danos decorrentes de acidentes de trabalho, sendo, portanto, plenamente compatíveis o art. 927, parágrafo único, do Código Civil e o art. 7º, XXVIII, da Constituição Federal. Isso nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida, por sua natureza, apresentar exposição habitual a risco especial, com potencialidade lesiva e implicar ao trabalhador ônus maior do que aos demais membros da coletividade. Com isso, independentemente da presença de culpa ou dolo, é viabilizada a indenização às vítimas em situações perigosas e de risco extraordinários e especiais, podendo ser citados como exemplos os acidentes nucleares e os desastres ambientais.
Para melhor compreensão, citaremos quatro exemplos da aplicação da responsabilidade objetiva em matéria de acidente do trabalho julgados pelo TST, casos esses levantados pelo autor Sebastião Geraldo de Oliveira:
No processo TST-Ag-ED-E-ED-RR-238100-91.2005.5.01.0202, o reclamante, cobrador de ônibus, foi vítima de assalto à mão armada no curso da prestação dos seus serviços; aqui, o TST decidiu que as atividades de motorista e de cobrador de ônibus de transporte coletivo possuem potencialidade lesiva superior aos demais membros da sociedade, de forma a caracterizarem-se como atividade de risco, aplicando-se a responsabilidade objetiva da empregadora diante da regra contida no artigo 927, parágrafo único, do Código Civil.
Em outro caso, no processo TST-E-ED-RR-120740-23.2007.5.03.0134 também se decidiu pela aplicação da responsabilidade objetiva em face da atividade de transporte de valores exercida pelo reclamante, que era vigilante de carro forte e foi atingido por um projétil durante um assalto ao veículo que trabalhava, restando reconhecido o acidente do trabalho e deferida indenização por danos materiais, morais e estéticos.
Em outra decisão interessante, no processo TST-E-RR-24256-63.2019.5.24.0061, o TST considerou aplicável a responsabilidade civil objetiva do empregador em acidente sofrido por vaqueiro no manejo de gado, entendendo ser esta uma atividade de risco, em que o fortuito, isto é, a reação inesperada de um animal diante de algum fato corriqueiro ou anormal, pode acontecer, fato que por si só potencializa a ocorrência de infortúnios. O resultado é que o trabalhador que se ativa com o gado está mais vulnerável e sujeito a um risco acentuado de sofrer um acidente de trabalho quando comparado a outros trabalhadores no exercício de atividades distintas, aplicando-se o artigo 927, parágrafo único, do Código Civil.
Por fim, no processo TST-RR-89900-22.2008.5.15.0082 um trabalhador da construção civil conseguiu a aplicação da responsabilidade objetiva pelo dano moral decorrente de doença do trabalho relativa à hérnia de disco adquirida no exercício da função de pedreiro. Ficou provado que trabalhou sem registro pelo período de 11 anos e sequer houve o gozo de férias, sendo negado ao empregado o direito fundamental ao descanso, capaz de minimizar os efeitos do esforço causado pela atividade, além de não haver condições de segurança e sem a atenção da medicina do trabalho, por realizar levantamento de paredes (pegar massa, pegar e colocar o tijolo, bater no tijolo e retirar o excesso de massa) que exige movimentos de flexão e de rotação da coluna vertebral, o que representa alto risco de doença profissional e maior exposição ao risco ergonômico, realidade que foi atestada pela perícia.
Com os casos mencionados, esperamos contribuir para que empregados e empregadores tenham melhor conhecimento acerca da possibilidade de aplicação da responsabilidade objetiva nos casos de acidente de trabalho e que trabalhem juntos para um meio ambiente do trabalho saudável.
*Carla Reita Faria Leal e Vitor Alexandre de Moraes são membros do Grupo de Pesquisa sobre Meio Ambiente do Trabalho da UFMT, o GPMAT.
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