DA REDAÇÃO
O esquema de fraude no Cadastro Ambiental Rural (CAR) da Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sema), alvo da Operação Polygonum da Polícia Civil, funcionava de pelo menos três formas diferentes, segundo o Ministério Público Estadual (MPE).
Uma delas funcionava por meio do deslocamento de polígonos. De acordo com o MPE, nessa modalidade, o engenheiro contratado pelo proprietário apresenta informações falsas para o órgão ambiental, deslocando a localização do imóvel rural desmatado para local onde há cobertura florestal.
Esse procedimento seria feito no sistema da Sema e a área seria mostrada com aparência de legalidade. O órgão ambiental, cooptado, aprovaria o cadastro.
Com tudo regular, torna-se possível expedir a Autorização Provisória de Funcionamento (AFP), indicando total regularidade ambiental. Com esse documento, pode-se obter financiamentos em instituições bancárias, dispensa nos pagamentos de reposição florestal e anistias de multas por desmatamentos ilegais (que em áreas de floresta amazônica é de R$ 5 mil por hectare).
Conforme o MPE, em um exemplo hipotético, uma fazenda que tenha desmatamentos de 200 hectares pode deixar de pagar, apenas a título de multas, R$ 1 milhão.
Outra modalidade apontada pelo MPE é mediante o desmembramento de propriedades.
Alair Ribeiro/MidiaNews
Um dos veículos apreendidos durante a terceira fase da Operação Polygonum, nesta semana
Para o Código Florestal, os imóveis com menos de 4 módulos fiscais em determinadas hipóteses não precisam reconstituir desmatamentos ilegais. No esquema, uma propriedade seria subdividida em diversos imóveis menores para ficar dispensada de obrigações ambientais.
De acordo com o Ministério Público, a Sema estaria autorizando, por exemplo, que uma fazenda que possua várias matrículas tenha os Cadastros Ambientais individualizados para cada uma delas. Assim, caso o mesmo imóvel possua 10 matrículas, poderá apresentar 10 cadastros e cada um deles é analisado individualmente, recebendo benefícios que seriam destinados apenas aos pequenos produtores - como, por exemplo, não precisar de áreas florestadas no imóvel, ter diminuídas as áreas de preservação em beiras de rios e receber anistias.
Com a fraude da fragmentação, segundo o MPE, a grande propriedade é subdividida em diversos imóveis menores. Na prática, é uma grande fazenda, mas que se passaria por diversos pequenos imóveis autônomos e independentes, nos quais os desmatamentos criminosos são legalizados ou se autorizam a abertura de novas áreas em locais não passíveis de exploração agropecuária.
O MPE alega que, como não há auditoria nos trabalhos de aprovação do Cadastro Ambiental Rural, tudo se resolveria mediante ajuste de proprietários, engenheiros e alguns servidores do órgão ambiental.
O Ministério Público apura, ainda, as chamadas “fraudes em tipologia”. Nessa modalidade, o proprietário contrataria um engenheiro para fraudar relatórios ambientais.
Um imóvel localizado em bioma amazônico, por exemplo, pode ser desmatado em apenas 20%. Contudo, se a tipologia florestal for de Cerrado, o proprietário tem direito a desmatar 65%. Com um relatório falso aprovado pela Sema, seria possível desmatar mais do que o triplo permitido pelo Código Florestal.
Assim, uma fazenda de 10 mil hectares, por exemplo, localizada no bioma amazônico, poderá desmatar 4.500 hectares a mais com o relatório fraudado aprovado pela Sema. Essas informações ficam registradas no sistema e, com o uso de imagens satélite, podem ser auditadas em qualquer momento, mesmo após os desmatamentos.
Morosidade
Segundo os dados do Certificado de Cadastro de Imóvel Rural do Incra (CCIR), Mato Grosso possui aproximadamente 155 mil imóveis rurais. Aproximadamente 80 mil apresentaram o CAR, sendo que o prazo final para entrega sem a incidência de multa é o dia 31 de dezembro de 2018. Por mês, são analisados pouco mais de 1 mil, sendo que grande parte acaba voltando com pendências.
De acordo com o MPE, em alguns casos, tal morosidade estimulava a corrupção para se furar a fila, dando-se prioridades a quem não faz jus ao benefício mediante esquema do então responsável pelo setor.
Outras apurações
Segundo o Ministério Público, outros fatos que apontam a fragilidade no sistema têm sido apurados, como a contratação de servidores mediante indicações políticas; falta de atualização dos dados geoespaciais da Sema; vulnerabilidades no módulo de análise; ausência de maior transparência e compartilhamento insuficiente de informações entre servidores; defasagens nas estruturas de tecnologia; ausência de metas; necessidade de ajustes na legislação e uniformização de procedimentos.
O MPE afirmou que, em parceria com a Dema, está em tratativas com a atual gestão da Sema e equipe de transição do novo governo para firmar Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para impedir a continuidade de fraudes no setor.
Operação Polygonum
Mais de 20 pessoas foram presas durante as três fases da Operação Polygonum, que apura fraudes na Sema.
Apenas na terceira fase da Operação Polygonum, deflagrada na última segunda-feira (3), nove mandados de prisões temporárias foram cumpridos, além de 12 mandados de busca e apreensão. Ao todo, foram expedidos pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso 10 ordens de prisão e 15 mandados de buscas.
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