MIKHAIL FAVALESSA, LÁZARO THOR E ALLAN PEREIRA
Da Redação
O ex-bicheiro João Arcanjo Ribeiro mantinha estreitas relações com integrantes das forças de Segurança Pública em Mato Grosso durante seu auge como empresário dono de factorings, enquanto comandava também o jogo do bicho. Documentos obtidos pelo Midiajur revelam pedidos de doação feitos por integrantes da Polícia Militar, cópias de documentos de um delegado nos arquivos, e ainda proximidade com um ex-secretário de Estado da área.
A documentação foi apreendida nas empresas e na casa de Arcanjo quando da deflagração da Operação Arca de Noé, em 2004, mas só veio à tona agora depois que foi obtida com exclusividade pelo Midiajur. Veja ao final a lista de matérias publicadas até aqui.
O próprio Arcanjo é um ex-policial civil. Ele atuava na Delegacia Regional de Polícia da Capital como investigador e foi exonerado do cargo pelo então governador, Frederico Campos, e pelo secretário de Estado de Segurança Pública à época, Paulo Santa Rita Carvalho de Athayde, em 23 de abril de 1979.
O registro mais antigo do ex-bicheiro como policial no Diário Oficial do Estado é de julho de 1974, como "contratado" da delegacia, pelo recebimento de diárias.
EX-SECRETÁRIO - Conforme revelado anteriormente pelo Midiajur, comunicações dos Ministérios Públicos Federal e Estadual direcionadas à Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp) estavam com Arcanjo quando a Arca de Noé foi deflagrada.
Documentos relativos ao ex-secretário de Segurança Hilário Mozer Neto também constam no rol de papéis apreendidos com o ex-bicheiro.
A PF apreendeu a documentação na Confiança Factoring Fomento Mercantil, uma das empresas de Arcanjo voltada a empréstimos, em grande parte feitos legalmente.
Hilário Mozer Neto foi chefe da Segurança Pública em momentos distintos, primeiro no final da década de 1980 e começo da década de 1990, e depois entre 1997 e começo dos anos 2000.
Segundo a descrição feita pela PF, Arcanjo tinha um envelope com cópia de um cheque emitido por Hilário Mozer Neto e sete notas promissórias, sendo que algumas delas haviam sido emitidas pela Assembleia Legislativa com o nome do ex-deputado Humberto Bosaipo.
DOAÇÕES À PM - Entre os documentos apreendidos pela PF em 2004 consta um ofício circular da antiga Companhia Independente de Operações Especiais (CIOE). A PF relata que o ofício foi assinado pelo então comandante da CIOE, Zaqueu Barbosa, que hoje é coronel da reserva e à época era capitão da Polícia Militar. De acordo com a descrição feita pela PF, o ofício pedia a Arcanjo "colaboração para festa de confraternização de fim de ano, para policiais e familiares" e o documento tinha ainda "diversas anotações".
À reportagem, Zaqueu negou que tenha assinado o documento. De acordo com o coronel, outro militar assinou o ofício durante seu "impedimento" como titular da CIOE. Ele registra que foi arguido sobre a situação na época da Arca de Noé e mostrou que não se tratava de sua assinatura. O coronel ainda lembra que deu apoio operacional à PF nessa operação e em diversas outras.
As doações feitas à PM eram comuns, conforme indicam os papéis arrecadados pela PF. Além do ofício do CIOE, os agentes apreenderam um envelope cinza no qual constava o resumo do movimento do mês de novembro de 2001 da VIP Factoring, uma das empresas do ex-bicheiro, e um pedido da PM supostamente assinado pelo coronel Altair Balieiro de "doação junto a VIP Factoring".
Balieiro, conforme o documento, comandava à época o Grupamento de Radiopatrulhamento Aéreo (Graer) da PM. O coronel foi para a reserva remunerada em 2007 e atua como advogado, além de exercer a função de juiz militar do Conselho Especial de Justiça por diversas vezes. Ele não foi encontrado para comentar o caso, mas o espaço segue aberto.
DELEGADO E FESTA - As relações com as polícias também são indicadas por documentos relativos ao delegado Reinaldo Martins Custódio, falecido em 2018.
A PF encontrou com Arcanjo uma sacola plástica contendo "formulário de informação pessoal, relatório cadastral de cedentes e cópia de RG e CPF do delegado de Polícia Civil - Reinaldo Martins Custódio".
Na mesma sacola estavam uma etiqueta do Banco de Crédito Nacional (BCN) de 15 de outubro de 2002 com extrato bancário, comprovante de depósito, relação da posição das duplicatas por vencimento, relação da posição das duplicatas por sacado, cópias de cheques, e resumo das operações e proposta de compra de crédito gerencial.
Policiais militares e civis constam ainda de uma lista de convidados para a festa de aniversário de Arcanjo, em comemoração a seus 50 anos. De acordo com a PF, a lista tinha "delegados, agentes e oficiais" da Polícia Civil e da Polícia Militar, mas o nomes não são revelados.
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