ALLAN PEREIRA
Da Redação
O protesto pelo piso salarial dos profissionais da enfermagem teve um tom forte e crítico aos hospitais particulares, seus diretores e a relação desigual entre os trabalhadores e seus colegas das demais áreas da saúde. Na manhã desta quarta-feira (21), em ato que se concentrou na região central da Capital, a técnica de enfermagem Paula Verônica Reis Costa, de 41 anos, fez forte defesa do piso para a categoria e afirmou que eles não vão mais aceitar serem explorados por diversas vezes. "A gente mantém os hospitais enquanto eles andam de carro de luxo", disse para o MidiaJur.
Paula e os outros profissionais de enfermagem ouvidos pela reportagem destacaram a contrariedade com a decisão do ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), de suspender a aplicação do piso.
Para Paula, o STF, que tem o princípio de zelar pela Constituição Federal, rasgou a Carta Magna de 1988. "O nosso salário já foi aprovado como manda o figurino, como está lá na Constituição. Tem que votar pelos deputados, pelos senadores e vai para a presidência. Aí volta de um para o outro e vira aquela putaria. Sabe porquê? Por que é o salário da enfermagem", disse indignada.
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O protesto faz parte de uma mobilização nacional em favor da criação do piso salarial da categoria a ser pago em todo o país por entidades públicas, privadas e filantrópicas.
Segundo o presidente licenciado do Sindicato dos Profissionais de Enfermagem (Sinpen), Dejamir Soares, hoje um técnico ganha, em média, R$ 1.380, e um enfermeiro R$ 2.800.
Allan Pereira/MidiaJur
Diretor de sindicato, enfermeiro Dejamir, fala com profissionais da categoria em protesto pelo piso salarial no Centro da Capital.
A proposta aprovada no Congresso Nacional e sancionada pelo Governo Federal pretende elevar esse mínimo para R$ 4.750 a enfermeiros, R$ 3.325 a técnicos de enfermagem e R$ 2.375 a parteiras e auxiliares. "É uma pequena valorização pelo que tanto que se salvou na pandemia”, diz.
Os profissionais realizaram uma manifestação, que faz parte de um ato de paralisação de 24 horas, aprovada em assembleia geral do Sinpen na última semana. O ato ganhou mais força depois que o Tribunal Regional do Trabalho em Mato Grosso (TRT-MT) deu uma liminar para suspender a greve de 24 horas. Dejamir afirma que eles não estão fazendo greve.
Além da Capital, outras cidades do interior de Mato Grosso também contaram com protestos, como Sorriso, Nova Mutum, Lucas do Rio Verde, Sinop e São José do Rio Claro.
Nós mexemos com vida, e não com máquina
Em Cuiabá, o ato reuniu centenas de profissionais na praça Alencastro, em frente à sede administrativa da Prefeitura de Cuiabá. Os profissionais se reuniram no coreto da praça e cantaram marchas contra o STF. "Barroso a culpa é sua; enfermagem na rua", disseram.
Em seguida, os manifestantes fecharam as ruas e bloquearam o trânsito em pleno horário de pico para destacar a luta pela criação do piso. Os trabalhadores da área da enfermagem subiram a avenida Getúlio Vargas, viraram pela rua Barão de Melgaço, desceram a avenida Isaac Póvoas, viraram na avenida Tenente Coronel Duarte e subiram de novo a Getúlio Vargas para voltar a praça. Durante a curta caminhada, sob sol de quase 40 graus, eles gritavam por "respeito", carregavam cartazes com críticas ao Barroso e estendiam faixas em valorização da categoria.
A técnica de enfermagem Paula cita o aumento de remuneração, aprovado pelos próprios ministros do STF, de R$ 39,2 mil para R$ 46 mil.
"Teve que ir lá para os deputados ou para os senadores? Infelizmente o que acontece no Brasil hoje é que os políticos estão entrando só para roubar. Dizem que não há verba e que os hospitais vão quebrar. Os hospitais não vão quebrar porque a classe que os mantêm, explorada, somos nós. É justo que a gente mantenha os hospitais, enquanto eles estão andando em caro de luxo. Os materiais para se trabalhar em hospital particular são contados. Isso, até de certa forma, é falta de respeito em algumas situações. Eles enriquecem e nós não conseguimos sobreviver".
"Fomos aplaudidos há dois anos atrás pelo mundo e, hoje, nós somos feitos de palhaços". É que afirma a técnica da enfermagem Joilce da Graça, que atua mais de quatro anos na profissão, quando questionada sobre a manifestação em favor da criação de um piso salarial para os profissionais da enfermagem. Em Cuiabá, o ato se concentrou na região central, na manhã desta quarta-feira (21).
Na mesma toada segue a técnica de enfermagem Joilce da Graça. Para ela, a decisão do STF é uma vergonha. Ela afirma também que a categoria merece o piso salarial. "Nós mexemos com vida, e não com máquina", diz.
E acrescenta: "nós levamos o vírus para dentro de casa. Eu conheço várias famílias de enfermeiros e técnicos que pai ou mãe morreram, por que levou o coronavírus para dentro de casa. Nós sofremos muito na primeira onda [da pandemia]. Não tínhamos horário de repouso por que não tinha profissional na época; tínhamos que dobrar em 36 horas trabalhando, deixando de ir na nossa casa e cuidar da nossa família para ter os cuidados com o paciente".
Allan/MidiaJur
Paula Verônica afirma que Constituição foi rasgada com decisão de Barroso.
O diretor do Sinpen, Dejamir Soares, afirma que a luta pelo piso continua até ser restabelecido e implementado.
“Essa movimentação ocorre no sentido de pressionar o Congresso Nacional a apresentar uma fonte de financiamento. Ontem, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, já deu uma coletiva dizendo que já tem a fonte, que o projeto já está caminhando no Congresso e que antes da eleição vai colocar para votar. A expectativa nossa é grande, mas a luta vai continuar até que de fato se concretize no bolso de cada trabalhador", disse.
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