LUCAS RODRIGUES
DA REDAÇÃO
O juiz Emerson Luis Pereira Cajango, da 4ª Vara Cível de Cuiabá, determinou o bloqueio das contas bancárias, em até R$ 4,7 milhões, da empresa EIG Mercados Ltda, antiga FDL Serviços de Registro de Cadastro e Informatização.
A determinação foi proferida no final de outubro e publicada nesta semana, durante cumprimento de determinação do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ-MT).
O bloqueio, que já havia sido determinado em junho, em caráter liminar (provisório), visa assegurar o pagamento de suposta dívida da EIG Mercados com a
A requerida deixou de repassar a participação da autora nos resultados, bem como deixou de apresentar o relatório trimestral das receitas e despesas
empresa Santos Treinamento e Capacitação de Pessoal Ltda – RG Treinamentos, que possuía sociedade com a mesma.
A EIG Mercados tem contrato com o Detran-MT desde 2009, e é responsável pelo registro de financiamentos de contratos de veículos, necessário para o primeiro emplacamento.
A empresa também seria o epicentro de um esquema milionário de pagamentos de propina a autoridades de Mato Grosso, suspeita surgida após o início de um processo de delação premiada do ex-presidente do Detran-MT, Teodoro Lopes, o “Dóia”.
De acordo com a ação, a RG Treinamentos teria firmado uma sociedade com a EIG Mercados, em que ficou acordado que a primeira empresa ganharia participação de 30% nos lucros derivados da execução dos serviços ao Detran.
O acordo garantiu à RG Treinamentos repasses mensais na ordem de R$ 596 mil durante o ano de 2014.
Porém, segundo a RG Treinamentos, de janeiro a abril deste ano a EIG Mercados deixou de repassar a distribuição dos lucros aos sócios, “levantando indícios de irregularidades contábeis e tributárias”.
Em razão disso, os representantes da RG Treinamentos foram até ao escritório da EIG Mercados em Cuiabá, que estava fechado.
Eles então se deslocaram à sede da empresa, em Brasília, ocasião em que foram informados de que a EIG Mercados havia rescindido o contrato unilateralmente e que não haveria qualquer repasse à RG Treinamentos.
Na ação, a RG Treinamentos classificou a rescisão do contrato como uma “fraude, ilegal, imoral e ato de má-fé”, uma vez que a mesma havia entrado com o capital para viabilizar o negócio.
Liminar atendida
Em decisão datada de maio, o juiz Emerson Cajango explicou que o pressuposto de um contrato é de que o negócio deve se pautar em regras de lealdade e confiança, portanto, é injustificada a exclusão da RG Treinamentos “no recebimento da participação dos lucros”.
“A requerida deixou de repassar a participação da autora nos resultados, bem como deixou de apresentar o relatório trimestral das receitas e despesas, deixando a requerente sem qualquer informação do andamento do mesmo, e por ser a requerida sócia ostensiva, esta tem dado continuidade na prestação dos serviços e nos recebimentos dos ganhos, excluindo-se a autora”, afirmou o magistrado.
Desta forma, Emerson Cajango atendeu o pedido liminar e determinou que a EIG Mercados pagasse à RG Treinamentos “os repasses pendentes do período de janeiro de 2015 a abril de 2015, no valor de R$ 2,38 milhões”, além de restabelecer os repasses mensais de R$ 596,6 mil.
Possível fraude
Para não pagar os valores, a EIG Mercados recorreu ao Tribunal de Justiça de Mato Grosso, sob o argumento de que a rescisão do contrato teria sido feita de comum acordo entre as partes.
A empresa defendeu que a decisão não possuía fundamentação e que foi aplicada uma inovação no “sistema processual civil brasileiro”, caracterizando um típico comando de cumprimento de sentença.
A EIG Mercados também reclamou que não teria como suportar um “abrupto desfalque” de quase R$ 3 milhões em seu patrimônio.
Em junho, o desembargador Dirceu dos Santos negou o pedido, em caráter liminar, ao verificar que a EIG Mercados não comprovou que o pagamento da dívida comprometeria a saúde financeira da empresa.
No mérito do caso, a EIG Mercados não teve melhor sorte. Em voto proferida na 5ª Câmara Cível do TJ-MT, o desembargador Carlos Alberto Alves da Rocha pontuou que a rescisão do contrato foi assinada por apenas dois dos cinco sócios das empresas.
“Todavia, verifica-se que o contrato social da empresa Santos Treinamento e Capacitação de Pessoal Ltda. estabelece que a sua representação será feita por todos os sócios sempre em conjunto [...] Desse modo, a priori e em uma análise superficial, entendo que há vício na representação da empresa agravada, quando da celebração do distrato”, explicou o magistrado.
Portanto, ante a existência de indícios de fraude, entendo que a agravada comprovou a plausibilidade do direito por ela perseguido
Carlos Alberto Rocha ainda afirmou que “salta aos olhos” o fato de que, em 20 de janeiro deste ano, os então sócios da EIG Mercados - Claudemir Pereira dos Santos e Rafael YamadaTorres -, logo após rescindirem o contrato “venderam as suas cotas sociais e se retiraram da empresa recorrida sem nada comunicar aos sócios remanescentes, conforme se verifica na décima alteração e consolidação contratual”.
“Portanto, ante a existência de indícios de fraude, entendo que a agravada comprovou a plausibilidade do direito por ela perseguido (fumus boni iuris).Por outro lado, o perigo da demora (periculum in mora) se evidencia do fato que a interrupção dos repasses evidentemente implicará em sérias dificuldades financeiras à recorrida”,afirmou Rocha, ao negar o pedido e ser acompanhado pelo desembargador Dirceu dos Santos e pela desembargadora Cleuci Terezinha Chagas.
Chuva de recursos
A decisão foi questionada em outro recurso, igualmente negado pela câmara, o que levou o juiz de 1ª Instância, Emerson Cajango, a determinar o bloqueio das contas da empresa para dar efeito prático à decisão.
Em outubro, após ingressar com vários recursos, a EIG Mercados requereu que o desembargador Carlos Alberto Rocha declarasse o efeito suspensivo ao caso, ou seja, enquanto os recursos pendentes não fossem julgados, a decisão sobre o bloqueio das contas não precisaria ser imediatamente cumprida.
Porém, o magistrado barrou a tentativa por falta de previsão legal e ainda citou reportagem do MidiaNews sobre o tema, publicada no dia 10 de outubro, que informou “sobre os valores arrecadados e repassados segundo o Presidente do Detran, que não se coadunam com aqueles mencionados na peça recursal”.
“É fato inconteste que aparentemente o valor é exorbitante, porém, deve ser observado que não se trata de ‘um único valor’, mas, é a soma da obrigação mensal descumprida que impõe essa ‘somatória’”, explicou o desembargador.
A 5ª Câmara Cível, de outubro a novembro, negou mais três recursos da EIG Mercados contra o bloqueio das contas. Todavia, ainda há quatro recursos pendentes, sendo que dois deles tentam levar a discussão ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e Supremo Tribunal Federal (STF).
Contrato é alvo do MPE
Em ação que tramita na Vara de Ação Civil Pública e Ação Popular de Cuiabá, o MPE acusa a antiga FDL e atual EIG Mercados de cobrar taxas exorbitantes - que variam de R$ 170,00 a R$ 400,00 - para o registro de financiamentos de contratos de veículos. A empresa atua dentro das dependências do Detran-MT, e apenas lança na carteira de habilitação que o carro é alienado.
Do valor arrecado com os serviços, a EIG Mercados ficava com 90% do valor arrecadado, repassando apenas 10% aos cofres da autarquia.
Em dezembro do ano passado, o percentual destinado aos cofres do Detran-MT foi elevado para 30% - e, no atual governo, o percentual é de 50%.
Em 2015, de janeiro a setembro, a arrecadação da FDL foi de R$ 19.985.127,12.
O MPE pede a suspensão do contrato que concedeu à EIG Mercados a prestação deste serviço, que rende, em média, R$ 24 milhões ao ano à empresa.
Segundo o MPE, a licitação que originou o contrato - com duração de vinte anos - seria "ilegal" e "inconstitucional". O ex-presidente Teodoro Lopes também é alvo da ação.
A EIG Mercados ingressou com dois recursos, em setembro passado, para tentar anular a ação.
Em 1ª Instância, o juiz Alex Nunes Figueiredo extinguiu a ação do MPE, sem analisar o mérito do caso, em novembro de 2013.
No entanto, a 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso anulou a decisão e determinou que o processo continuasse a tramitar.
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