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OPINIÃO Terça-feira, 05 de Novembro de 2024, 15:18 - A | A

05 de Novembro de 2024, 15h:18 - A | A

OPINIÃO / CARLA REITA FARIA LEAL

Trabalho infantil no Brasil: realidade persistente e violações de direitos

Carla Reita Faria Leal e Amanda Cunha da Costa



Conforme os dados mais recentes divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), por meio da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), em 2023, cerca de 1,6 milhão de crianças e adolescentes, com idades entre 5 e 17 anos, estavam em situação de trabalho infantil.

Desses, mais de 1,2 milhão eram adolescentes de 14 a 17 anos. Tal percentual representa 4,2% do total de pessoas nessa faixa etária. Embora tenha havido uma diminuição em relação a 2022, quando esse índice alcançou 4,9%, o trabalho infantil permanece um problema preocupante e complexo em nossa sociedade, impactando profundamente o desenvolvimento físico, emocional e educacional de crianças e adolescentes, perpetuando ciclos de pobreza e exclusão social.

Apesar de os dados recentes sinalizarem um leve avanço, eles também evidenciam que ainda há um longo caminho para garantir que todos os jovens brasileiros tenham seus direitos preservados e possam crescer em ambientes seguros com oportunidades. Quanto ao resultado do PNAD 2023, no que tange às piores formas de trabalho infantil (TIP), o contingente de menores submetidos ao trabalho infantil na Lista TIP foi o mais baixo da série histórica, com 586 mil pessoas em 2023, recuando 22,5% em relação a 2022, quando 756 mil crianças e adolescentes estavam nessa situação.

Para enfrentar esse revés, a legislação brasileira estabelece normas para tratar sobre o assunto. A Constituição Federal, em seu artigo 7º, inciso XXXIII, proíbe o trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de 18 anos e qualquer trabalho a menores de 16 anos, salvo na condição de aprendiz a partir de 14 anos. O artigo 227 da Carta Magna estabelece que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de protegê-los de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Já a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) corrobora o disposto na Constituição ao dispor no artigo 403 a proibição de qualquer trabalho a menores de 16 anos, salvo na condição de aprendiz a partir de 14 anos. O artigo 405 proíbe o trabalho aos menores de 18 anos em locais e serviços prejudiciais à sua moralidade. Além disso, os Artigos 428 a 433 regulamentam o contrato de aprendizagem, garantindo a formação técnico-profissional metódica aos jovens aprendizes, dentre outros.

Ao ratificar as convenções internacionais, como a Convenção n.º 138 e a Convenção n.º 182 da OIT, o Brasil consolida internamente os padrões internacionais que o país deve seguir, orientando a elaboração de políticas públicas e de ações de fiscalização para erradicar o trabalho infantil e garantir um ambiente seguro para o desenvolvimento dos jovens. A Convenção n.º 182, além de dispor sobre o conceito de trabalho infantil, trata sobre a piores formas de trabalho infantil, definindo-as como trabalho forçado ou obrigatório, exploração sexual, atividades ilícitas e trabalhos prejudiciais à saúde, segurança ou moralidade da criança. Esta convenção foi ratificada no Brasil pelo Decreto Legislativo n.º 178, de 14 de dezembro de 1999, e promulgada pelo Decreto n.º 3.597, de 12 de setembro de 2000, tendo seus artigos 3º, alínea "d", e 4º regulamentados pelo Decreto n.º 6.481/2008.

Nesse contexto, faz-se necessário citar decisão recente da Justiça do Trabalho de Mato Grosso, por meio da qual uma indústria cerâmica foi condenada por empregar um adolescente em condições insalubres em sua olaria, atividade considerada uma das piores formas de trabalho infantil (Lista TIP). A sentença, proferida pelo juiz Muller Pereira, da Vara do Trabalho de Colíder, determinou o pagamento de R$10 mil por danos morais ao adolescente, além de adicional de insalubridade, verbas rescisórias e a regularização do vínculo de emprego. A decisão também apontou que o trabalho em horas extras afetou a frequência escolar do adolescente, em desrespeito à Convenção n.º 182 da OIT, ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e à Constituição Federal. A condenação foi mantida por unanimidade pelo Tribunal Regional do Trabalho de Mato Grosso (TRT/MT).

Casos como o mencionado acima ilustram a dimensão e a gravidade desse problema em setores produtivos variados. Nesse contexto, torna-se urgente discutir as causas estruturais dessa prática, os danos profundos causados aos jovens trabalhadores e as estratégias necessárias para erradicá-la definitivamente.

*Carla Reita Faria Leal e Amanda Cunha da Costa são membros do Grupo de Pesquisa sobre o meio ambiente de trabalho da UFMT, o GPMAT.

 

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