O GLOBO
O compositor mineiro Ary Barroso não conhecia a capital da Bahia quando compôs, em 1938, a canção "Na Baixa do Sapateiro", que seria eternizada na voz de Carmen Miranda e posteriormente faria parte da superprodução da Disney de 1944, "Você já foi à Bahia?".
Em 2 de dezembro de 1940, finalmente, ele chegou a Salvador (BA) para uma visita. Foi quando um vereador da cidade, Luis Monteiro da Costa, sugeriu que a data fosse transformada no Dia Nacional do Samba.
Embora não seja oficialmente reconhecida pelo governo federal, a data é muito respeitada. Aliás, a lei já prevê, desde 2017, que 25 de novembro é o Dia Nacional do Samba de Roda. Foi nesse dia, em 2005, que o samba de roda recebeu o título de Obra-Prima do Patrimônio Oral e Imaterial da Humanidade, reconhecido pelo Comitê da Organização das Nações Unidas para Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).
Ano após ano, especialmente em Salvador (BA) e no Rio de Janeiro (RJ), o dia 2 de dezembro é celebrado com grandes shows, apresentações de escolas de samba – e também as tradicionais rodas –, que reúnem a plateia e os músicos em um ambiente de descontração e celebração.
Identidade cultural
— O samba é nossa cultura. Os brasileiros sambam quando estão tristes, quando estão felizes. Não como dança, mas como estilo de vida, como forma de organizar o mundo —, resume o cantor e compositor Marcelo D2.
O historiador Luiz Antonio Simas lembra que o samba é sim, brasileiro, mas a partir de alguns fundamentos que vieram do centro da África. — O samba é brasileiro, a partir da musicalidade do Congo, de Angola. É um ritmo, mas também uma coreografia que o acompanha —, relata.
— A identidade cultural do brasileiro foi um processo de construção. Ela foi redesenhada nas primeiras décadas do século XX, que é justamente quando o samba começa a tomar força —, lembra, por sua vez, Daniela Miranda, criadora de conteúdo digital, famosa pela frase: “— Nem todos os lugares a que vou tem samba, mas levo meu samba a todos os lugares a que vou! — O samba nada mais é do que a diversidade cultural. A nossa identidade foi construída com o samba.
Ponto de resistência
Independentemente da data, o samba precisa mesmo ser celebrado. Afinal, o gênero musical centenário se tornou capaz de sintetizar de forma expressiva a cultura de um país inteiro tão diverso quanto é o Brasil.
Na tradicional casa carioca Beco do Rato, instalada em um cantinho da Rua Joaquim Silva, na Lapa, a data vai ser muito festejada, assim como acontece nos demais 364 dias do ano.
— Até 2004, minha família tinha um depósito de bebidas no local. No final da tarde, os trabalhadores que passavam por ali pediam uma cerveja. Foi quando meu pai teve a ideia de valorizar esse momento de interação, de fortalecimento de amizades, para criar um bar com roda de samba. Na época, a Lapa era carente de boas opções —, descreve Lucio Pacheco, dono do Beco do Rato desde que seu pai faleceu, há nove anos. E foi assim, na base da amizade entre os frequentadores da Lapa, que surgiu o Beco.
De fato, foi sobre as conexões criadas em torno dos fins de tarde da comunidade que a casa surgiu e se fortaleceu. Mais uma prova do poder agregador do samba, especialmente das novas gerações. — Desde o início, demos espaço para vários artistas que não tinham a oportunidade de tocar em casas conhecidas. Somos, há 20 anos, fomentadores do samba —, conclui.
Foco na qualidade
Comprometido em levar conforto e qualidade para os frequentadores da casa, que conta com três ambientes interligados, Pacheco transformou o Beco num ponto de resistência, mas também em uma importante atração, que reúne cinco mil pessoas toda semana. Vale lembrar que, há cem anos, participar de rodas de samba era malvisto e músicos e plateia estavam sujeitos a serem detidos pela polícia.
— Aqui, provamos que o samba não é bagunça, é um fenômeno cultural e uma importante forma de expressão popular. Este ano realizamos um festival com 14 horas de música, que reuniu 8.500 pessoas. Para o ano que vem, projetamos levar o evento para outras cidades —, diz Pacheco.
Assim, a casa leva adiante uma tradição importante: reunir pessoas em torno de uma roda de samba, que é, como define Marcelo D2, o melhor ambiente para extrair o melhor dessa expressão cultural tão agregadora.
Qualquer ambiente é ideal para curtir um bom samba. Mas o lugar mais clássico ainda é a roda, concorda Simas: — O samba é um fenômeno coletivo, está ligado ao encontro, à confraternização, à coletividade. É na roda que acontece a experiência mais visceral, mais forte. Quando acompanhada de cerveja gelada e petiscos gostosos, a experiência entrega um grande congraçamento coletivo.
Viva o samba!
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