LÁZARO THOR
Da Redação
No dia 8 de maio de 1892, o escritor Machado de Assis aconselhou o governo brasileiro a "abandonar" a província de Mato Grosso. A proposta foi feita depois que o escritor carioca leu nas manchetes dos jornais do Rio de Janeiro notícias sobre um levante militar que havia proclamado a "República Transatlântica de Mato Grosso", separando a província do estado brasileiro.
O movimento nascia de uma insatisfação de militares do estado, a maioria veteranos da Guerra do Paraguai. Era um grupo denominado à epoca como "patriotada" por jornais que circulavam no estado.
Os militares de oposição ao então presidente da província, Manuel Murtinho, queriam tomar o poder local e estavam indignados com as nomeações de adversários feitas pelos primeiros presidentes da República: Marechal Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto.
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"Mato Grosso foi o assunto principal da semana. Nunca ele esteve menos Mato, nem mais Grosso. Tudo se esperava daquelas paragens, exceto uma república", escrevia Machado de Assis nas primeiras linhas de sua crônica.
No texto, o escritor conta que alguns jornais londrinos aconselharam o governo brasileiro a abandonar a província, por estar distante da capital. Ciente dos interesses ingleses nas terras brasileiras, Machado brinca (e zomba) da ideia:
"Se eu fosse governo, aceitava o conselho, e pregava uma boa peça à nova república, abandonando-a, não à sua sorte, como dizem as duas folhas, mas à Inglaterra. A Inglaterra também perdia no negócio, porque o novo território ficava-lhe muito mais longe; mas, sendo sua obrigação não deixar terra sem amanho, tinha de suar o topete só em extrair minerais, desbastar, colonizar, pregar, fazer em suma de Mato Grosso um mato fino", diz trecho da crônica
República Transatlântica
O Partido Nacional, composto pelos revoltosos e indignados com a nomeação de adversários como presidentes da província, saiu de Corumbá com destino a Cuiabá e depôs o intendente municipa. O coronel João da Silva Barbosa, um dos líderes do movimento, propôs a ideia da nova república, que reverberou em jornais canadenses e ingleses, mas não em Mato Grosso, onde a o assunto foi tratado com desdém.
Wikipedia
Em 19 de novembro de 1985, o jornal O Matto Grosso, do militar Generoso Ponce, descrevia os integrantes do movimento como "Patriotada de pau e corda". No artigo em que critica a "patriotada", Ponce comenta um panfleto produzido pelo militar e ex-chefe do Correio, Victal Araújo, que foi intitulado "Para a História. Reflexões críticas sobre a Revolução de Matto Grosso".
Nos registros do jornal de Ponce, há a menção de que a ideia dos revoltosos seria "hipotecar" Mato Grosso à Inglaterra para possibilitar recursos que viabilizassem a proclamação da nova república. Criou-se então uma bandeira, semelhante a bandeira da província, mas com a inscrição "República Transatlântica".
Hemeroteca Digital
Página do artigo "Coisas e loisas", do jornal O Matto Grosso, com comentários acidos sobre a "República Transatlântica"
A ideia de separação é tratada com tanto escárnio por Machado de Assis, que o cronista não pondera em escrever: "Eu, rigorosamente, não tenho nada com isto. Não perco uma unha do pé nem da mão, se perdermos Mato Grosso. E não é melhor que me fique antes a unha que Mato Grosso? Em que é que Mato Grosso é meu?", diz outro trecho do artigo.
O escritor ainda defende, tratando agora com uma seriedade travestida de ironia, que o estado não destruiu a pátria, mas apenas organizou a sua. O que, segundo ele, seria sinal de que não haveria problema na separação da província.
"Vede bem que a nova república é una e indivisível. Aqui há dente de coelho; parece que o fim é tolher a soberania a Corumbá, a Cuiabá, que poderiam fazer as suas constituições particulares, como os diversos Estados da União fizeram as suas", brinca o escritor.
No fim, o escárnio de Machado fez todo sentido, diante da derrota dos revoltosos. E a solução veio rápido, pouco tempo depois de sua crônica: uma ofensiva de militares enviada pelo então presidente Floriano Peixoto, que cessou a força da "patriotada"
"A proporação que avançava a força libertadora avançava o ardor belicoso, que não tinha coragem de dar um passo fora
das fortalezas inexpugnáveis onde viviam apertados como sardinhas, prometiam bombardear a cidade, tática reles, baseada em que à essa notícia, os vingadores sustariam a sua marcha", descreveu O Matto Grosso no artigo "Coisas e loisas".
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Lodovico Settembrini 09/04/2023
De fato, dona Célia! Esse Machado de Assis deve ter apertado 13 com força na urna! E a senhora, tá acampada ainda na frente do quartel? Saudações patriotas!
Célia Regina Silva Paixão 09/04/2023
Com certeza esse Machado de Assis era outro FDP PETRALHA DE NASCIMENTO ???? L.i.x.o sua literatura.
2 comentários