LISLAINE DOS ANJOS
DO MIDIANEWS
O Ministério Público Estadual propôs duas ações à Justiça relacionadas à suposta compra de vaga no Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso (TCE-MT).
Em uma das ações, os promotores Célio Fúrio, Roberto Turin e Sérgio Silva da Costa pedem o afastamento imediato do conselheiro Sérgio Ricardo, que supostamente teria comprado a vaga do então conselheiro Alencar Soares.
Na ação, proposta contra Sérgio Ricardo, a Assembleia Legislativa, o Tribunal de Contas e o Governo do Estado, o MPE também pede a anulação da indicação, nomeação e da posse do atual conselheiro.
Em outra ação sobre o mesmo tema, os promotores pedem o afastamento imediato do cargo do conselheiro Sérgio Ricardo e a indisponibilidade dos bens dele e de outras sete pessoas: o governador Silval Barbosa (PMDB) e o senador e ex-chefe do Estado, Blairo Maggi (PR); o ex-conselheiro Alencar Soares e seu filho, o empresário Leandro Soares; o ex-secretário de Estado Eder Moraes; o conselheiro afastado Humberto Bosaipo; e o deputado estadual José Riva (PSD).
Também nesta ação, o MPE requer à Justiça a condenação dos acusados por ato de improbidade administrativa - somando-se aos oito, o empresário e delator do esquema, Júnior Mendonça - e o ressarcimento de dano ao erário, dando à causa o valor de R$ 12 milhões “para efeitos de fixação do dano a ser recuperado, indenizado e devolvido”. O valor, aliás, refere-se ao "custo" da vaga supostamente comprada por Sérgio Ricardo no TCE.
Investigação e “compra de vaga”
"As tratativas iniciais foram entabuladas com o então conselheiro do TCE Alencar Soares Filho visando a compra da vaga, com a aposentadoria antecipada dele, fazendo surgir a possibilidade do Poder Legislativo indicar um membro do parlamento estadual a ser nomeado no lugar dele"
Ambos prestaram depoimentos dentro do contexto da Operação Ararath, deflagrada pela Polícia Federal, que investiga um esquema de lavagem de dinheiro por meio de operações ilegais com factorings e empresas.
Na ação em que pedem pela anulação da indicação de Sérgio Ricardo ao cargo de conselheiro, os promotores afirmam que os depoimentos confirmam “com riqueza de detalhes, a forma como ocorreu a negociação da vaga de conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso, aberta para atender aos interesses escusos de um grupo delinquente e, mais especificamente, do requerido Sérgio Ricardo”.
De acordo com o MPE, em fevereiro deste ano, Mendonça narrou “com precisão a forma imoral, ilegal e ilícita com que essa negociação foi encaminhada e, posteriormente, concretizada”, sendo que todo o esquema teria sido iniciado em 2008, quando Sérgio Ricardo ainda ocupava o cargo de deputado estadual e era presidente da Assembleia Legislativa.
Consta na ação que o atual conselheiro, com a ajuda de José Riva, resolveu utilizar o “esquema” de Júnior Mendonça e o montado no BicBanco, para levantar recursos e assegurar a compra da cadeira até então ocupada pelo conselheiro Alencar Soares.
“As tratativas iniciais foram entabuladas com o então conselheiro do TCE Alencar Soares Filho visando a compra da vaga, com a aposentadoria antecipada dele, fazendo surgir a possibilidade do Poder Legislativo indicar um membro do parlamento estadual a ser nomeado no lugar dele. O contexto apurado no caso presente demonstra que já estava negociada e acertada a vaga para o então deputado estadual e hoje conselheiro do TCE, o requerido Sérgio Ricardo”, diz trecho da ação.
Durante a delação premiada, Júnior Mendonça afirmou que, em 2009, o então governador Blairo Maggi (PR), obteve dele, por meio de Eder Moraes, R$ 4 milhões para pagar o então conselheiro Alencar Soares.
Divulgação/TCE |
Ex-conselheiro Alencar Soares teria recebido dinheiro para liberar a sua cadeira no Tribunal de Contas do Estado |
Alencar Soares teria recebido o dinheiro das mãos de Júnior Mendonça, a pedido, e na presença, de Eder Moraes, que, por sua vez, agiria “no interesse e a mando de Blairo Borges Maggi”.
Segundo os autos da Ararath, Sérgio Ricardo, então deputado estadual, já teria pago R$ 4 milhões a Alencar, pra que ele deixasse a vaga.
O repasse de Mendonça a Alencar Soares teria servido para que ele pudesse devolver a Sérgio Ricardo os R$ 4 milhões anteriormente dele recebidos – e, alegadamente já gastos.
O pagamento dessa segunda vantagem foi feito pela empresa Globo Fomento Ltda., de Júnior Mendonça.
“Liberação da cadeira”
Segundo a ação, apesar da negociação ter ocorrido anos antes, a liberação da vaga acertada com Alencar Soares ocorreu apenas em 2012, “depois da devolução e após a quitação dos valores acertados”
“O conselheiro Alencar Soares, cumprindo sua parte na negociação ímproba, liberou sua vaga pertencente à proporção reservada à Assembleia Legislativa e, a toque de caixa, atendendo a um indevido acordo político, o então deputado estadual Sérgio Ricardo foi escolhido pela Assembleia Legislativa para ocupar a vaga de conselheiro do Tribunal de Contas deste Estado”, disse.
"O conselheiro Alencar Soares, cumprindo sua parte na negociação ímproba, liberou sua vaga pertencente à proporção reservada à Assembleia Legislativa e, a toque de caixa, atendendo a um indevido acordo político, o então deputado estadual Sérgio Ricardo foi escolhido pela Assembleia Legislativa para ocupar a vaga de conselheiro do Tribunal de Contas deste Estado"
“Não atende aos requisitos”
Conforme o MPE, Sérgio Ricardo “não pode e não deve ser conselheiro do Tribunal de Contas”, por não preencher os requisitos legais exigidos para posse do cargo.
Isso porque, segundo consta nos autos, além da acusação de compra de vaga no órgão, ele responde a ações civis públicas por atos de improbidade administrativa supostamente praticados quando ainda ocupava o cargo de deputado estadual.
Alegando que as acusações que pesam contra o conselheiro são “contundentes e gravíssimas”, os promotores requerem o imediato afastamento dele do cargo ocupado no TCE, bem como a suspensão de qualquer remuneração, “pois essa situação ilegal e imoral, baseada em resolução, ato de nomeação e termo de posse nulos, tem causado prejuízo ao erário”.
O MPE requer, no mérito da referida ação, a nulidade da posse e a determinação da perda do cargo e imediata exoneração do conselheiro para que seja providenciada a liberação da vaga. À essa causa, o MPE deu valor de R$ 414.798,96, “para efeitos meramente fiscais”.
Improbidade administrativa
Na segunda ação sobre a compra de vaga no TCE, o MPE pede pela condenação dos nove acusados citados anteriormente por prática de ato de improbidade administrativa.
Na ação, onde é novamente reafirmada a ação de compra da vaga do conselheiro Alencar Soares pelo então deputado Sérgio Ricardo, os promotores ressaltam a existência de uma segunda negociata envolvendo uma cadeira do TCE, dessa vez para beneficiar o ex-secretário de Estado, Eder Moraes, com o aval do atual senador e então governador, Blairo Maggi (PR).
“A participação de Éder Moraes no sistema criminoso já ocorria anteriormente, mas toma corpo no começo de 2009, quando ele sentiu a necessidade de se tornar membro do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso e obteve apoio do então Governador do Estado Blairo Maggi nessa empreitada”, diz trecho da ação.
Em depoimentos ao MPE, Eder teria afirmado que participou de vários encontros com Alencar Soares e seu filho, o empresário Leandro Soares, a fim de selar a compra da vaga, que no final das negociações estaria estimada em R$ 12 milhões.
"A participação de Éder Moraes no sistema criminoso já ocorria anteriormente, mas toma corpo no começo de 2009, quando ele sentiu a necessidade de se tornar membro do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso e obteve apoio do então Governador do Estado Blairo Maggi nessa empreitada"
“Infere-se [...] que os requeridos praticaram inquestionavelmente atos dolosos de improbidade administrativa que implicaram em enriquecimento ilícito, causaram lesão ao erário e, cumulativamente, violaram princípios administrativos”, diz trecho da ação.
Acusações
Segundo o MPE, Alencar Soares vendeu sua vaga por R$ 12 milhões – tendo sido confirmado o recebimento de R$ 4 milhões -, sendo então “auferida vantagem patrimonial indevida (recebimento de dinheiro de corrupção)”, bem como dano ao erário, “ao colaborar para a perda patrimonial por desvio e apropriação de valores pertencentes ao Estado”, tendo ainda “atentado contra a administração pública”.
“Se não bastasse isso permitiu, concorreu e facilitou por ato de corrupção, que houvesse incorporação ao patrimônio dele e de particular, de valores que integravam o patrimônio do Estado de Mato Grosso e foram desviados. Com isso, houve colaboração para que terceiro se enriquecesse ilicitamente, além dele. É inquestionável o prejuízo ao erário”, afirma o MPE.
As mesmas acusações pesam sobre o senador Blairo Maggi (PR) e contra o governador Silval Barbosa (PMDB). Segundo a ação, Blairo “participou de reuniões e ordenou devolução de dinheiro, tendo também ordenado pagamentos, retardando e depois concretizando compra de vaga de conselheiro do TCE, inicialmente segurando e depois forçando a aposentadoria antecipada de Alencar Soares, com o firme propósito de abrir a oportunidade de ingresso de protegidos, em negociata realizada na surdina, da qual presenciou, tinha conhecimento e aderiu”.
Já Silval “aderiu e entabulou negociata na surdina, concretizando-a posteriormente com a nomeação de Sérgio Ricardo na vaga comprada de Alencar Soares, em acerto ímprobo, realizado sorrateiramente. Forneceu e deu permissão a Éder Moraes para providenciar negócios imorais, permitindo repasses extraídos do “conta corrente”, de onde também tomou empréstimos cobertos com recursos públicos”.
Já o ex-secretário de Estado Eder Moraes é apontado como o “mentor, articulador e gerente do plano imoral e ímprobo”, tendo contra si as mesmas acusações dos anteriores, enquanto o empresário e delator do esquema, Júnior Mendonça, é apontado como “operador e executor do plano”.
O conselheiro afastado Humberto Bosaipo teria se apresentados, nas reuniões de negociações de venda de cadeira, como representante do Tribunal de Contas, tendo sido “beneficiado com “empréstimos”, denominados de “agrados”, realizados com o sistema “conta corrente”, alimentada, mantida e coberta com recursos públicos desviados dos cofres do Estado de Mato Grosso, oriundos de “esquema” montado para apropriação de dinheiro público”.
A participação nas negociações que culminaram na indicação de Sérgio Ricardo ao TCE também pesam contra o deputado estadual José Riva, que responde às mesmas acusações dos demais.
O filho de Alencar Soares, Leandro, é acusado de ter fornecido, informações, facilitado e indicado transferência de propina relacionada à compra da vaga de seu pai no TCE, “com indicação de contas onde deveriam ser depositados recursos públicos desviados e operados pelo “sistema””.
O MPE acusa Sérgio Ricardo dos mesmos atos relatados acima, acusando-o de ter comprado a vaga com o pagamento de propina, o que “resultou em inquestionável enriquecimento ilícito e auferimento de vantagem patrimonial indevida, em razão do exercício do cargo de deputado estadual, com inquestionável incorporação ao seu patrimônio e de outrem, de valores mencionados e integrantes do patrimônio público estadual”.
Confira as íntegras das ações AQUI e AQUI.
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